CTB de 1998 municipalizou o trânsito, transferindo a responsabilidade pela sua operação às prefeituras, mas 80% delas não têm estrutura para cuidar disso.
O consultor do Programa Volvo de Segurança no Trânsito, J. Pedro Corrêa, sugere um novo papel para os Detrans como forma de ajudar a resolver a falta de estrutura na maior parte das cidades brasileiras para gerenciar o trânsito em seu próprio município. Confira a entrevista ao Portal PVST sobre este assunto:
Portal PVST: Como é a situação da municipalização do trânsito no país hoje?
J. Pedro Corrêa: O Código de Trânsito Brasileiro definiu que a responsabilidade pela operação do trânsito municipal passaria a ser das prefeituras, cabendo a elas o gerenciamento do trânsito e fazer cumprir as leis incluindo aplicação de multas. Mas a verdade é que a grande maioria dos nossos municípios não tem como fazer isso. Dos mais de 5.560 municípios, cerca de 80% deles têm menos de 30.000 habitantes, ou seja, são muito pequenos para comportar uma estrutura de transito e transporte e muitas vezes nem mesmo um engenheiro de trânsito. O policiamento de trânsito nestas cidades geralmente inexiste pois os poucos policiais que nelas atuam cuidam da segurança pública e raramente do trânsito. Assim, a circulação de veículos e de pessoas acaba ficando por conta deles mesmo com tudo de bom ou de mau isto possa significar. Este assunto foi abordado no livro ?20 anos de lições de trânsito?, de minha autoria e publicado em 2009, por meio do patrocínio do Ministério da Cultura e Volvo. Na verdade, esta foi uma das únicas denúncias apresentadas no livro que por sinal está disponível para download no Portal do PVST.
Portal PVST: Então, quer dizer que boa parte dessas cidades nem possui órgão ou departamento de trânsito, ou agentes para fiscalizar as ruas e o cumprimento da lei?
J. Pedro Corrêa: Exatamente. Pior que isso, acredito mesmo que muitos prefeitos dessas pequenas cidades, nem sabem que são os responsáveis pelo trânsito e que podem ser podem ser processados por eventuais mortes ou tragédias de trânsito que eventualmente venham a ocorrer na cidade.
Portal PVST: E o crescimento da frota, em todo o país, leva o problema também para as pequenas cidades.
J. Pedro Corrêa: Correto. E nem precisamos esperar a frota crescer. As estatísticas que usei em 2009 indicavam que aproximadamente cerca um terço das fatalidades de trânsito do país aconteciam nessas cidades menores. É bom ressaltar que boa parte desses acidentes fatais não ocorrem nas áreas centrais destas cidades mas em trechos de rodovias que cortam estes municípios.
Portal PVST: E como esse problema pode ser resolvido?
J. Pedro Corrêa: É preciso deixar claro que a municipalização foi boa para o trânsito em geral mas não foi suficientemente boa para os pequenos municípios e que são muitos pelo País. Diante desta dificuldade, é importante encontrar mecanismos capazes de ajudar os menores. Uma solução possível seria envolver os estados, atribuindo-lhes mais responsabilidades sobre esta área pois com a transferência da gestão do trânsito para os municípios, ele, Estado, praticamente ficou de fora ? os Detrans passaram a se ocupar basicamente de documentação da frota e de carteiras de habilitação. Como os Detrans são os órgãos de trânsito mais altos na hierarquia dos governos estaduais, poderiam ser incumbidos de assistir a esses pequenos municípios no gerenciamento do trânsito local. É bom lembrar que, em regra geral, os Detrans são instituições que têm dinheiro e não seria nada complicado se estruturarem para esta nova missão.
Portal PVST: Seria uma forma de revitalizar os Detrans, que hoje se resumem a órgãos emissores de documentos de veículos e carteiras de habilitação?
J. Pedro Corrêa: Sim, penso que os Detrans podem ser estruturados para ir bem além dessas competências sem grandes dificuldades. Acredito ser possível atender esses municípios, evitando que este problema, até hoje negligenciado, torne ainda pior o caos que já estamos vivendo no trânsito brasileiro.