O mês de março começou com a implantação do exame toxicológico para motoristas profissionais habilitados nas categorias C (transporte de carga), D (transporte de passageiros), e E (condutor de veículo com dois reboques acoplados). A partir de agora, o exame é obrigatório na admissão ou desligamento dos empregos, e na renovação da carteira de habilitação.

Basta um fio de cabelo ou uma amostra de unha para realizar o exame toxicológico, que é capaz de detectar a presença de drogasaté trêsmeses antes da sua realização (janela de detecção). Ronaldo Laranjeira é professor-titular do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e trabalha com ênfase em alcoolismo e dependência de drogas. Para ele, a lei que obriga os motoristas a fazer o exame é mais um importante passo que o Brasil adota para reduzir o número de mortos no trânsito. “O país teve mais de 50 mil mortes diretas decorrentes de acidentes de trânsito, isso sem contar aqueles que morreram nos dias subsequentes aos acidentes e os que ficam sequelados”.

O consumo de drogas pelos caminhoneiros tem crescido em função das jornadas exaustivas de trabalho e a pressão pela entrega rápida das cargas. A Universidade Federal de Minas Gerais calcula que três em cada dez caminhoneiros usam rebites e anfetaminas para ficarem acordados ao volante. Além disso, o Ministério Público do Trabalho do Mato Grosso do Sul estima que a cada três caminhoneiros que rodam pelas estradas brasileiras, um pode estar drogado. Os efeitos dessas substâncias em motoristas profissionais é extremamente perigoso devido ao potencial de mortos e feridos que um acidente com veículos de carga ou de transporte de passageiros pode trazer.

Mais controle

Com a implantação da Lei Seca, o Brasil passou a ter um nível de tolerância bastante restritivo ao consumo de álcool ao volante. No entanto, a fiscalização é falha e o controle para garantir a aplicação da lei não ocorre na mesma intensidade em todas as cidades brasileiras. “Nos Estados Unidos, todas as viaturas da polícia possuem bafômetros com o objetivo de retirar motoristas alcoolizados das ruas. A intolerância da sociedade americana é muito forte e a fiscalização é eficiente. No Brasil ainda há um grande descontrole, devido ao tamanho da nossa malha viária, à quantidade de motoristas profissionais que temos e que dirigem por muitas horas seguidas em longas distâncias. Nossa polícia rodoviária não possui estrutura nem equipamentos para realizar o controle necessário. Por isso, a implantação do exame toxicológico é um avanço legislativo que auxiliará nesse controle. É mais um passo diante de um problema tão grande. Mas a fiscalização será fundamental para que a lei seja cumprida. Precisamos ter mais comprometimento com essa causa”, destaca Ronaldo.

A sofisticação dos controles do consumo de álcool e drogas pode ser um caminho para que o número de mortes no trânsito diminua. Na aviação, por exemplo, um piloto deve se submeter constantemente a exames antes de assumir o comando da aeronave. “Por isso, podemos nos espelhar nesse exemplo para evoluir em nossos sistemas de controle. No Brasil poderia ser criada uma lei que ligasse o exame toxicológico ao seguro de cargas, como uma forma de monitorar ainda mais as condições de quem está realizando o transporte”, sugere Ronaldo.

O Programa Volvo de Segurança no Trânsito (PVST) também acredita que a nova legislação pode trazer avanços.“Todas as medidas que forem implantadas no país e que contribuam para aumentar a segurança nas estradas são bem-vindas. Entretanto, é preciso que toda a cadeia de transporte se envolva neste problema do uso de álcool e drogas por motoristas profissionais. É importante ter claro que, em vários aspectos, o contexto que envolve as condições de trabalho desses motoristas contribuem em muito para esse cenário atual. É uma responsabilidade que deve ser compartilhada, não é somente do motorista”, destaca Anaelse Oliveira, responsável pelo PVST.